10 fevereiro 2010

Primeiros Momentos * * A Partida

O Boeing 707 dos TAM (Transportes Aéreos Militares)

O autocarro passou a porta de armas onde dois soldados da Polícia Aérea faziam o controle e guarda e parou junto a um enorme hangar que serve ainda de recepção das tropas militares a embarcar.

Carlos nunca andou de avião, sentia o pequeno frio da primeira vez. O serviço militar é assim, “Maria vai com as outras”, alguns o que já eram conhecedores das manobras, começaram a dirigir-se para o grande portão do hangar que estava levemente entreaberto. Ao passar o portão, ficou espantado com o enorme vão livre de todo o hangar, aquilo era enorme, mais parecia um campo de futebol.

Se voltaram a reagrupar alguns grupos, mas a maioria se mantinha isolada, poucos eram os que se conheciam entre eles, coexistiam naquele imenso espaço umas 180 pessoas mais meia dúzia menos meia dúzia, de todas as mais diversas armas e patentes.

Estavam por ali especados, olhando uns para os outros que nem parvinhos que tinham perdido qualquer coisa e agora nada encontravam. Uns se encostavam ás paredes, outros de mãos dos bolsos, mais uns arranjando o dólmen, como se aquele andrajo tivesse por onde lhe pegasse. Carlos se mantinha calmo e em tudo reparava, um retirou a boina ajeitou o cabelo e a recolocou na cabeça com todos os cuidados, como em frente de um espelho estivesse e fosse mostrar pela primeira vez a farda “Feijão Verde” à namorada, Carlos sorriu com a presunção, outro esfregou os sapatos nas calças, por traz das canelas, mais uns que andavam de um lado para o outro não escondendo o nervosismo da sua primeira viajem aérea.

Num repente e pelas 11:00 um altifalante ribombou e uma voz masculina começou a dar informações.

- Linhas Aéreas Militares, Srs. passageiros queiram dirigir-se ao portão azul com o Bilhete que lhes foi entregue na mão.
Carlos não se moveu, deixou que os já sabidos se movessem primeiro, seguindo o velho princípio militar que tinha aprendido no tempo de recruta nas Caldas da Rainha “ Maria vai com as outras, se não sabes, esperas para ver”.

Voltou a voz no altifalante “ Embarque para Luanda e Beira”

Esta era nova para ele, passagem por Angola, “nada mau, telho família por lá, sempre vou dar um abraço, os gajos poderiam ter dito antecipadamente e avisaria a prima”, pensou Carlos, por fim entrou na fila, que isto da tropa é tudo na fila, na linha ou na bicha, não existe opção na escolha.

Chegou ao portão onde todos iam entregando o bilhete de embarque, onde um soldado da força aérea ia retirando parte do bilhete e entregando o restante de volta ao portador.

Caminhou para fora do hangar, sentiu o ar frio na face, parou para ler o que restava do bilhete, uma série de números onde um deles indicava a cadeira onde se sentaria no avião, Carlos disse entre dentes,
- Espero que seja junto a uma janela, sempre dá para ver por onde se passa.

Carlos pensaria que andar de avião é igual a carruagem de comboio!

A fila se manteve agora na direcção do Boeing 707 dos TAM, não teve de andar muito a aeronave estava junto ao hangar.

Reparou então no tamanho do avião o achou enorme, uns soldados levavam uma escada do tipo triângulo recto para junto da porta perto do “focinho” (Cockpit) do avião a fila tinha parado para as manobras necessárias na instalação da escada. Em terra se mantinha um soldado, todo aprumado que ia repetindo cuidado que os degraus estão húmidos enquanto a fila era engolida para o bojo da nave aérea.

Entrou pela primeira vez num avião, sorriu como criança, mostrou o bilhete ao soldado que executava a recepção e este lhe apontou por perto uma cadeira junto a uma janel. Ainda pensou “ ainda há anjos”, colocou o saco entre as pernas e manteve-se de pé vendo qual o comportamento a adoptar com o saco, reparou que alguns abriam a tampa de uma caixa e colocavam lá os haveres de mão. Reparou que ninguém usava mala, só o característico sacão militar. Imaginou que em lugar de bagagens como já tinha visto no Aeroporto da Portela o bojo do avião iria repleto de material militar, ou de material logístico mais urgente.

Novamente um altifalante, se fez ouvir.
Agora um Coronel das FAP informando que era o comande do voo e piloto principal tendo como co-piloto um Tenente-Coronel das FAP, lá disse o nome dele e do seu auxiliar. Deu indicações do tempo em Luanda e que chegariam dentro de 8 horas à capital Angolana.

Logo após ter falado o altifalante da aeronave se fez ouvir, outra voz, desta vez um cabo das FAP dando as indicações necessárias para o aperto dos cintos, iniciando de seguida uma ladainha sobre os procedimentos a ter em caso de alguma emergência.

Carlos vira-se para o passageiro que tem a seu lado e num desabafo.
- Para quê esta merda toda, se a lata cai nem o sebo dá para aproveitar, o outro deu um sorriso amarelo e se mudo estava, mudo ficou.

O avião inicia a marcha rolando lentamente para a pista, Carlos ia espreitando pela janela todo o movimento que se processava no exterior, perto da entrada da pista o aparelho parou, achando estranho o procedimento, tentou encontrar uma explicação para a paragem, muito pouco tempo se passou e lá volta a rolar agora para uma pista bem larga, se ouve o ensurdecedor ronco dos motores e o 707 começa a rolar cada vez mais veloz, percorrendo rapidamente a pista até que saiu de terra elevando-se rapidamente nos ares.

Respirou de alivio e da janela, via Lisboa, toda uma imensidão de casario, passando junto à ponte Salazar ficou admirado com a deslumbrante paisagem que dos ares se podia recortar.

Carlos não tirava os olhos de Lisboa, como de menino deslumbrado fosse. Ainda disse para consigo “Adeus Lisboa, assim que puder eu volto, prometo”. E voltou nem uma nem duas, volta sempre que pode, gosta de se sentar numa das esplanadas na Rua Augusta e ver as “garinas” passar.

Karl d'Jo Menestrel
10/02/2010

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